TRABALHO EM MOTRICIDADE OROFACIAL COM ASSIMETRIA DE FACE EM ADULTO - ESTUDO DE CASO |
Stella Maria Cortez Bacha
Apresentador(a) de Caso |
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Descrição do quadro: Paciente do sexo feminino, 31 anos, odontopediatra, procurou atendimento fonoaudiológico no mês de setembro de 2004 devido à cirurgia ortognática realizada no final de 2003. A alteração ortodôntica pré-cirúrgica referia-se a retrusão mandibular (má oclusão Classe II de Angle) com mordida cruzada à direita. A cirurgia ortognática envolveu mandíbula e maxila: intrusão da maxila de 4 milímetros, avanço mandibular de 14 milímetros, tendo sido também realizado enxerto ósseo na protuberância mentual. Foram utilizadas 7 placas e 30 parafusos. Apesar da grande satisfação com o resultado estético obtido, a paciente procurou o atendimento fonoaudiológico tanto por orientação do cirurgião quanto por convicção própria, para complementar o trabalho cirúrgico. A paciente apresentou na avaliação fonoaudiológica inicial, Distúrbio Miofuncional Orofacial e Cervical caracterizado por assimetria em face e lábios, alteração das funções de respiração, mastigação, deglutição e fala, com leve comprometimento da sensibilidade do lábio inferior (pós-cirúrgico). A preocupação desta era mais com a assimetria antero-posterior da face, que era de difícil caracterização, com o lado direito mais volumoso e com melhor força muscular, e com o lado esquerdo em condição oposta, descrito pela paciente como sendo um lado com musculatura fraca. Parecia que o lado direito estava ainda inchado devido à cirurgia, mas a paciente e o cirurgião disseram que já estava normal. Relatou sempre ter mastigado à direita e realmente apresentava mastigação predominantemente unilateral direita. A parestesia pós-cirúrgica citada referia-se apenas ao lado esquerdo do lábio inferior. O lábio superior era flácido, hipofuncionante e com posição habitual desviada para a esquerda. A língua também era flácida com posição habitual no assoalho da boca. Antes da cirurgia era respiradora oral e depois melhorou, mas mantinha os lábios semi-abertos na posição habitual. A deglutição era atípica com leve projeção anterior. Na fala espontânea “repuxava” o lado esquerdo da face e lábios. A postura de ombros era com projeção, mas estava sendo trabalhada com profissional especializado. Ainda usava aparelho ortodôntico fixo nas duas arcadas. Procedimentos: Terapia miofuncional orofacial envolvendo alongamentos, exercícios isométricos, alguns isotônicos e funções. Os alongamentos realizados foram de pescoço e ombros com boca fechada, no lado direito da face (com 3 dedos: polegar internamente e indicador e médio externamente, com movimentos lentos e profundos). Os exercícios isotônicos envolviam principalmente lábios e posição habitual de língua para cima. Os isométricos envolviam bochechas (principalmente esquerda), lábios e língua. Trabalhou-se a mastigação, diretamente com alimentos, mais à esquerda até melhorar a trofia. A deglutição também foi trabalhada de forma direta com água e alimentos. O trabalho com a fala foi realizado através de exercícios com grupo de fonemas, leitura de textos, fala dirigida com temas variados, bem como com a fala espontânea. Ao mesmo tempo em que era claro e evidente a hipertrofia muscular da face à direita, inclusive com melhor resposta de força, era de se pensar se não era uma assimetria congênita, pois o lado esquerdo parecia “esquecido” apesar de ter o sulco nasolabial mais marcado (ou era o direito que era pouco marcado pela hipertrofia?). Resultados Obtidos: Após 10 sessões havia obtido melhoras nas funções, os lábios estavam mais simétricos, a assimetria da face havia melhorado quanto ao volume (à direita), mas ainda apresentava o sulco nasolabial esquerdo muito marcado. Não houve melhora da parestesia labial e posição habitual da língua. Encaminhei então para a dermatologista (com a qual já fazia tratamento de pele) e para o cirurgião plástico que trabalhava em conjunto com esta para ver se os dados obtidos das avaliações destes profissionais nos ajudariam quanto ao prognóstico fonoaudiológico ou se era realmente o limite do nosso trabalho em face e lábios, sendo então indicados outros procedimentos. A dermatologista disse que era necessário melhorar o sulco nasolabial esquerdo com procedimentos dermatológicos e também sugeriu intervir no lábio superior que estava começando a ter rugas. O cirurgião plástico também sugeriu preenchimento do sulco nasolabial. Nenhum deles avaliou a etiologia do quadro ou as condições musculares, segundo a paciente. Como eram tratamentos temporários e onerosos, a paciente não se animou e então, mesmo eu estando em dúvida quanto aos rendimentos, propus investir mais nos exercícios de motricidade orofacial. A partir de então a paciente empenhou-se mais e, já sem o aparelho ortodôntico, realizou mais exercícios e cuidava-se mais quanto à estabilização do padrão correto das funções estomatognáticas. Usava contenção móvel na arcada superior. A minha visão do caso nesta fase era: aparentemente o lado direito é que estava ruim e o esquerdo bom, mas faríamos a intervenção no lado esquerdo, pois como eu poderia diminuir mais o lado direito?. Um exercício que auxiliou muito na suavização da comissura nasolabial esquerda foi o de resistência realizado mais na região dos zigomáticos e comissura, com a bolinha (bem pequena) acrílica em cabo de metal. Vários outros foram tentados, mas houve aumento de rugas em regiões adjacentes (principalmente lábio superior) sem melhora do nosso foco, e por isso, imediatamente abandonados. O exercício selecionado não promoveu rugas e aumentou a força muscular localizada, pois a força era realizada apenas na bolinha, sem flexibilidade da haste, e a paciente conseguiu realizá-lo com facilidade. O trabalho com a fala visou diminuir o hábito de “caretas”, que promovia rugas na face e lábios. Os resultados fonoaudiológicos após 18 sessões (uma vez por semana) foram muito bons. Manteve-se a posição habitual da língua no assoalho, mas sem intervenção na oclusão dentária e houve pouca melhora da parestesia labial. Por outro lado houve grande melhora da estética facial, inclusive na visão da dermatologista. Conclusão: O atendimento deste caso proporcionou-me várias reflexões: 1- que realmente se pode mudar a hipótese diagnóstica inicial no decorrer do atendimento; 2- que é preciso estar muito atenta aos resultados provocados pelos diversos exercícios, principalmente os isométricos, podendo alcançar bons resultados em força, mas péssimos resultados em estética ou levando ao aparecimento de movimentos associados; 3- que é preciso durante todo o tratamento, enquanto ainda se estiver longe dos objetivos, buscando soluções, averiguar mais os dados anteriores à cirurgia (no caso); 4- que muitas vezes o trabalho fonoaudiológico tem limites e encaminhamentos paralelos se fazem necessários; 5- que também se deve confiar na possibilidade alcançar melhores resultados estéticos; 6- que a Estética não é uma possibilidade nova na prática fonoaudiológica em Motricidade Orofacial, mas sem dúvida a sistematização de seus procedimentos permitem melhor julgamento daqueles utilizados quando do tratamento das Alterações e, por ser esta sistematização recente, cuidados e mais estudos são necessários; 7- que no caso de assimetria facial apresentado houve necessidade de atenção especial a determinados grupos musculares, não tendo sido suficientes a adequação das funções estomatognáticas, principalmente por se considerar o tipo de alteração e o tempo da existência desta; 8- que a quantidade de sessões fez diferença e, particularmente neste caso, os resultados satisfatórios só foram obtidos com quase o dobro das sessões propostas inicialmente, mas mesmo assim foi um trabalho breve, perfazendo aproximadamente 5 meses de tratamento com sessões semanais. Controles têm sido realizados; 9- O sucesso deste caso deveu-se ao fato de se buscar continuamente procedimentos adequados, de se tentar compreender os limites e os alcances do trabalho fonoaudiológico e, por outro lado, da motivação e colaboração da paciente.
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Contato: sbacha@terra.com.br |
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