DESAFIOS DA FORMAÇÃO E ATUAÇÃO DA FONOAUDIOLOGIA NO SUS |
Maria Cecília Bonini Trenche
Coordenador(a) |
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Nos últimos anos, com a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases (1996), o sistema educacional brasileiro passou por profundas transformações. Novas modalidades de ensino tais como os cursos seqüenciais e de educação à distância, foram criadas. Introduziu-se formas alternativas ao tradicional exame do vestibular para a seleção e ingresso no ensino superior. Novas sistemáticas de autorização e reconhecimento de cursos foram implementadas. Implantou-se o sistema de avaliação das IES, por meio do PAIUB Programa de Avaliação Institucional da Universidade Brasileira e o Exame Nacional de cursos, o \"provão\", sistema posteriormente substituído pelo Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior (SINAES) que, em linhas gerais, é constituído por processos de auto-avaliação e o Exame Nacional de Desempenho do Estudante (ENADE).
Com a extinção do currículo mínimo os cursos de graduação de Fonoaudiologia passaram a observar as recomendações das diretrizes curriculares nacionais, gestadas num amplo debate entre IES, órgãos e entidades de classe e o MEC-SESu e aprovadas pelo Conselho Nacional de Educação (CNE) em fevereiro de 2002. Entre todas essas mudanças uma nos interessa de modo muito especial na mesa proposta para o XII Congresso da Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia a ser realizado em Santos: as novas diretrizes para cursos de Fonoaudiologia e a formação profissional para a atuaçao no SUS. Antes de adentrarmos no tema específico desta mesa faremos uma breve digressão sobre como era concebida a formação acadêmico-profissional, sem, no entanto, ater-me em datas. Por muito tempo os currículos de graduação estiveram voltados para a uma capacitação técnica de profissionais demandados pelo mercado de trabalho. As rápidas transformações no mundo da produção evidenciaram o quão estreita, limitada e principalmente vulnerável era essa formação frente às oscilações de tais demandas. Furtados, em sua maioria, de um aprendizado de regras e cultivo ao pensamento, à discussão, à construção de conceitos que iluminam as interpretações cientificamente fundamentadas da prática profissional, os egressos dos Cursos de Fonoaudiologia foram induzidos a explicações lineares da razão instrumental de seu fazer, sem reflexão maior da função social das práticas fonoaudiológicas. E deste modo constituíram-se em presas fáceis dos apelos do mercado de trabalho, das soluções fáceis e das explicações simplistas do seu fazer profissional. Mas a submissão da formação à ditadura do mercado de trabalho que tem exigências imediatas, conjunturais, e obedece a uma lógica, na maior parte das vezes, perversa, traz conseqüências sérias ao exercício profissional por não se compatibilizar com a função social precípua da Fonoaudiologia. Muitos profissionais, no entanto, atentos às essas questões e na necessidade de ampliar o debate e atuação profissional construíram os andaimes da área cujos práticas contribuem hoje para iniciativas de uma atenção integral e de qualidade à saúde da população
Com a implantação das diretrizes curriculares nacionais preconizadas pela LDB um desafio foi feito às Instituições de Ensino Superior: a construção de projetos pedagógicos voltados para uma formação técnica ancorada em sólida formação geral. Por não se confundir com formação superficial ou panorâmica, essa formação, denominada generalista, caracteriza-se pelo rigor teórico metodológico e pelo domínio das competências e habilidades da atuação clínico e terapêutica.
O novo conceito de currículo incorpora a parte que antes era ocultada dos processos de ensino-aprendizagem, das condições e estratégias utilizadas para se alcançar os objetivos propostos. Sob a forma de projeto, o currículo explicita uma proposta de organização do conjunto de atividades acadêmicas, de estratégias utilizadas no processo de ensino aprendizagem,de recursos humanos e materiais (bibliográficos, de infra-estrutura) necessários para à formação profissional, ao desenvolvimento de saberes, habilidades, competências imprescindíveis à prática clínica fonoaudiológica, básica para todas as demais atividades exercidas pela área.
Esse novo conceito apoia-se também nos princípios de que o estudante durante sua formação profissional deve receber educação integral, ser considerado um sujeito com condições de participar ativamente do processo de ensino/aprendizagem, de desenvolver habilidades cognitivas (raciocínio e registro de informações), afetivas (relações interpessoal) sociais (valores e atitudes) e lingüísticas (elaboração discursiva e interdiscursiva), de trabalhar suas vocações, interesses e potenciais, aprimorar seu estilo, de desenvolver sua capacidade de planejar seu percurso de formação e adquirir autonomia, crítica e capacidade de resolver problemas no campo profissional, quando lhe sejam dadas as oportunidades e condições concretas.
Está, também, implícita, a idéia de que as instituições produzem educação de melhor qualidade quando têm autonomia para otimizar seus recursos humanos e materiais, e os alunos se tornam melhores preparados para o exercício da cidadania, quando os projetos pedagógicos comprometem o egresso com a realidade social, para o acolhimento e resolução de problemas sociais, locais ou regionalizados.
Na definição de competências e habilidades gerais em torno de um perfil do profissional da área da saúde, as diretrizes exigiram a incorporação de conteúdos e práticas formadoras no campo da Saúde Pública, enfocando entre outros aspectos como Epidemiologia, Políticas de Saúde e Gestão de Sistemas e Serviços de Saúde. Elas apontam para o perfil de um profissional que seja capaz de decidir; de oferecer resolutividade para problemas de saúde em nível individual e coletivo; de comunicar-se com outros profissionais e com a população; de assumir liderança de equipes; de gerir e empreender e sobre tudo saiba aprender a aprender.
A inserção das Políticas Públicas na Fonoaudiologia, sobretudo do Sistema Único de Saúde, é uma necessidade real, no entanto tem se observado que a oferta de disciplinas de saúde pública nem sempre procede de forma contextualizada e articulada. Muitas vezes, essas disciplinas são oferecidas por docentes de outras áreas que não conseguem caracterizar as ações de Fonoaudiologia no âmbito do SUS. Inserir este conteúdo num eixo longitudinal, onde integre o estudante à realidade sanitária, desde seu ingresso no curso vem sendo um grande desafio para implementação das diretrizes curriculares.
Importante dizer, que desde 2003, o Ministério da Saúde, em nova política de formação profissional vem propondo ações em parceria com o MEC na realização de projetos como o AprenderSUS, os Pólos de Educação Permanente em Saúde, as Residências Multiprofissionais em Saúde e o das estratégias de formação de Facilitadores de Educação Permanente em Saúde e de Ativadores dos Processos de Mudança nos Cursos Universitários da Área da Saúde. Tais projetos estão voltados para a melhoria da qualidade na formação profissional com vistas a melhorar a qualidade na atenção à saúde da população.
Neste sentido o debate, a troca de experiências de profissionais que desenvolvem iniciativas que possibilitam mudanças no modelo de ensino e atenção à saúde e nas formas de participação social, coerentes com os princípios do SUS são ações muito bem-vindas porque tratam de uma temática atualíssima e urgente na Fonoaudiologia. |
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Contato: cecilia@trenche.com.br |
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