ATUAÇÃO MULTIDISCIPLINAR NO ATENDIMENTO DA SÍNDROME DE MÖEBIUS
Zelita Caldeira Ferreira Guedes
Palestrante
Instituição: UNIFESP
 
ATUAÇÃO MULTIDISCIPLINAR EM SEQÜÊNCIA DE MÖEBIUS Profa. Dra Zelita Caldeira Ferreira Guedes, Ph.D. UNIFESP/EPM A Síndrome de Möebius é uma paralisia ou paresia normalmente bilateral do Nervo Facial devido à ausência total ou parcial do núcleo, caracterizada por produzir face em máscara ou falta de expressão facial, inabilidade para sorrir, estrabismo convergente, ausência de movimentação lateral dos olhos e do piscar, dificuldade para fechar os olhos, seguidos de ressecamento da córnea, hipoplasia de mandíbula e de maxila, baba, palato alto e estreito, língua pequena ou mal formada, alterações de dentes, problemas auditivos, malformações de extremidades, e muitas vezes acompanhada de anomalias de outros pares de nervos crânicos. O nervo abducente e o hipoglosso são os mais comumente acometidos. Muitas dessas alterações têm sido associadas a alterações genéticas do tipo autossômico dominante, autossômico recessivo, recessivo ligado ao X, dentre outros. Segundo alguns autores como Lammens, Moerman, Fryns, Schöder, Spinnewyn, Casaer, Dom (1998) tal síndrome pode ser causada por uma anomalia no tronco cerebral com necrose resultante de um fenômeno de interrupção por infecção fetal ou anoxia durante a 5ª/6ª semanas de gestação. Outros autores, como Bouwes-Bavinck, Weaver (1986) postulam que a causa da Síndrome de Möebius seja a interrupção de suplência sanguínea na fase embriogênica. Devido ao comprometimento de outros pares crânicos, estas crianças podem apresentar dificuldades de sucção e deglutição logo ao nascimento, que podem perdurar por mais tempo e inclusive prejudicar o desenvolvimento da fala. Nem sempre elas podem deglutir a saliva e a baba é evidente por não haver oclusão do músculo orbicular da boca. Esta doença é esporádica e pode ocorrer em cerca de 0.23 a 1.4% de nascidos vivos. De 1880 até 1993 nasceram cerca de 186 pacientes (Carr, Ross, Zuker, 1997) identificados na literatura. Entretanto, grande parte destas crianças nasceu após tentativas frustradas de aborto, com o uso de misoprostol. Esta droga é um análogo sintético da prostaglandina E1, prescrita para úlceras gástricas ou duodenais e que normalmente quando administrada por via oral, intravaginal ou ambas, no primeiro trimestre da gestação provoca o aborto e quando este não ocorre, há o nascimento de uma criança com Möebius, vista a contração intra-uterina e interrupção vascular da artéria subclávia, entre as 4ª/6ª semanas de gestação. Num estudo realizado por Pastuszak (1996) com crianças brasileiras cerca de 49% das mães havia utilizado a droga para tentativa de aborto, no primeiro trimestre da gestação. Nossa preocupação, em lançar mão de cuidados para com estes pacientes, dá-se em virtude da ausência da mímica facial e do quanto tal característica tem sido considerada importante como participante da comunicação oral. Esta lacuna favorece graves transtornos psico-sociais que por sua vez acarretam dificuldades de comunicação para esses pacientes. A principal comunicação não verbal dá-se pela mímica facial e embora haja uma grande preocupação tanto estética como funcional com estes pacientes, o sorriso tem sido uma das únicas manifestações a receber técnicas cirúrgicas para a sua melhor expressividade (Chuang, Wey, Noordhoof, 1989). O fato de o paciente apresentar uma face alterada pode ocasionar a idéia de que ele é portador também de algum comprometimento intelectual, que nesta população, embora possa ocorrer, não é em número expressivo. Outra dificuldade é a interação interpessoal com outras crianças, principalmente na escola. Vários profissionais têm tentado estabelecer diferentes cirurgias com o intuito de estabelecer melhores padrões de movimento facial. Entretanto, nenhuma delas pode restaurar completamente a expressão facial normal. Os pacientes com Seqüência de Möebius têm necessidade terapêutica precoce, pois além da alteração da expressão facial, estes pacientes podem apresentar dificuldades para se alimentar. Os diferentes profissionais darão atenção ao paciente e a orientação dos pais. A participação dos diferentes profissionais na equipe multidisciplinar, através de pesquisas científicas, trará contribuições com estratégias de prevenção e promoção da saúde, com uma proposta de orientação aos pais sobre os cuidados e riscos da saúde no desenvolvimento pré, peri e pós-natal, instrumentalizando-os para modificarem os seus estilos de vida, assim como as condições sociais, econômicas e ambientais que determinam a saúde; e posteriormente, criar oportunidades para otimizar as potencialidades de seus filhos acometidos pela doença, durante o seu desenvolvimento físico e psíquico. As ações faciais prestam uma excelente facilitação para a aproximação ou afastamento do outro; a expressão de surpresa é devida a uma orientação visual; a de desgosto, a uma rejeição. Fica claro, que todos estes gestos, posturas e mímicas estão a serviço da expressão emocional e esta deverá ser a motivação que será associada à resposta motora. Não resta a menor dúvida de que o portador de Paralisia Facial Congênita do tipo Möebius está desfavorecido perante os outros indivíduos, quanto à comunicação, devido à ausência de mímica facial. Entretanto também é visível que muito pode ser realizado a fim de minimizar esta dificuldade: exercícios faciais na tentativa de estabelecer algum movimento, por menor que seja; favorecer o uso da voz e da gestualidade corporal como complementares à comunicação oral; acompanhamento psicológico como auxiliar no desenvolvimento dessas crianças e assistência a seus familiares; atendimento multidisciplinar (fonoaudiólogos, dentista, psicólogo, neurologista, geneticista dentre outros) para abordagem dos pacientes como um todo e não apenas da seqüela da paralisia. O objetivo desta atuação multidisciplinar é desenvolver de forma integrada um programa que vise (1) atender o paciente portador de Paralisa Facial Congênita (primordialmente a Seqüência de Möebius) e seus familiares, em todos os aspectos quer de avaliação, orientação e processo terapêutico e difundi-lo para outros centros, possibilitando um atendimento correto e objetivo desse paciente, independente da sua origem e o (2) treinamento de profissionais da área de saúde, favorecendo a identificação rápida do portador da doença e com o devido direcionamento para o tratamento. Acreditamos que uma equipe multidisciplinar que já atua nessa área em conjunto há alguns anos, composta de fonoaudiólogos, dentista, psicólogo, psiquiatra, geneticista, neurologista e que mantém contato com associações de pais e de pesquisas desses pacientes tanto no Brasil como no exterior, poderá pleitear auxílio para o desenvolvimento desses procedimentos e estendê-los de forma mais consistente a este e outros serviços de saúde. Em nossos Ambulatórios na Disciplina de Distúrbios da Comunicação Humana da Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP/EPM temos atendido por cerca de doze anos pacientes portadores dessa doença, tanto para avaliação e orientação como para procedimento terapêutico, incluindo a gestualidade Nosso serviço recebe solicitação para avaliação e orientação de pacientes de outras entidades, em diversas oportunidades, até de outros estados da União. É bastante comum que uma criança seja diagnosticada com essa manifestação e a família mora em local, onde não há qualquer profissional que possa conduzir o processo terapêutico, inviabilizando a adaptação ou melhora do quadro do paciente. Atualmente, esses pacientes já vêm sendo submetidos à investigação fonoaudiológica (fala, linguagem e audição), ortodôntica, psicológica, neurológica e genética. A orientação às famílias tem sido realizada tanto desde o nascimento (quando o paciente nos chega de forma precoce) ou mais tardiamente na fase pré-escolar ou escolar. A abordagem terapêutica tradicional de estimulação muscular vem sendo realizada, além de um favorecimento ao uso da gestualidade como ação complementar à comunicação. Acreditamos que esta abordagem multidisciplinar favoreça não só o conhecimento melhor destes pacientes, mas principalmente patrocine uma melhor condição de convívio social. Bibliografia: Bouwes-Bavinck JN, Weaver DD – Subclavian artery supply disruption sequence: Hypothesis of a vascular etiology for Poland, Klippel-Feil and Möebius anomalies – Am. J. Med Genet 23: 903-918, 1986. (1986) Carr MM, Ross DA, Zuker RM – Cranial Nerve Defects in Congenital Facial Palsy. J. of Otolaryngology 26 (2): 80-87,1997. Chuang DCC, Wey FC, Noordhoof MS – “Smile” Reconstruction in Facial Paralysis Annals of Plastic Surgery 23(1):56-65, 1989. Lammens M, Moerman Ph, Fryns JP, Schöder JM, Spinnewyn D, Casaer P, Dom R – Neuropathological findings in Möebius Syndrome. Clin. Genet 54: 136-141,1998. Pastuszak AL, Schüler L, Speck-Martins CE, Coelho KEFA, Cordello SM, Vargas F, Brunoni D, Schwarz VD, Larrandaburu M, Safattle H, Meloni VFA, Koren G - Use of Misoprostol during Pregnancy and Möbius Syndrome in Infants. The New England Journal of Medicine 338(26): 1881-1885,1996.
 
Contato: zelitaferreira@uol.com.br
 

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