DIVERSIDADE TEÓRICO-METODOLÓGICA NA PESQUISA EM LINGUAGEM: OS PROBLEMAS DOS ESTUDOS QUANTITATIVOS
Fernanda Dreux Miranda Fernandes
Palestrante
 
Diversidade Teórico-Metodológica na Pesquisa em Os estudos quantitativos em linguagem em geral buscam identificar as características universais e únicas que identifiquem uma determinada alteração. Quanto mais nítida for essa identificação, maior a contribuição do estudo, uma vez que ele facilitará a troca de informações entre pesquisadores, o estabelecimento de estratégias de intervenção mais especificamente dirigidos às dificuldades identificadas e possivelmente procedimentos de prevenção ou de identificação precoce. A determinação de características universais e únicas de comuns a um grupo de sujeitos permite a identificação de quadros clínicos específicos e pode favorecer o desenvolvimento de procedimentos de diagnóstico e terapia fonoaudiológicos cada vez mais eficazes e eficientes. Entretanto, a linguagem não pode ser artificialmente separada de nenhum dos elementos envolvidos nos processos de comunicação, se o interesse for o estudo das e a intervenção nas questões relacionadas às pessoas incluídas nesses processos. Assim, há diversos problemas metodológicos relacionados à pesquisa quantitativa em linguagem. As freqüentes mudanças em muitos critérios diagnósticos fazem com que muitas vezes seja impossível dizer se dois estudos diferentes sobre o mesmo tema referem-se realmente a populações semelhantes. Isso ocorre, por exemplo, com estudos nacionais e internacionais a respeito dos distúrbios específicos de linguagem (DEL), dos transtornos do espectro autístico e dos distúrbios da linguagem escrita, entre outros. A heterogeneidade das manifestações observadas é um outro elemento de dificuldade. Essa diversidade pode estar associada, quer a manifestações de variações individuais – em uma área, a linguagem, em que a normalidade também apresenta enormes diferenças – quer a elementos contextuais – orgânicos, sociais, ambientais – cuja interferência em aspectos específicos da linguagem são sempre muito difíceis de determinar. Nem sempre o controle desses fatores é um elemento considerado no delineamento da pesquisa, quer por não ser considerados importantes, quer por haver algum impedimento do ponto de vista ético. Uma pesquisa, por exemplo, com pessoas autistas ou afásicas, que exigisse que seus participantes não fizessem uso de medicamentos dificilmente seria aprovada por uma comissão de ética para pesquisa, pois ela implicaria na negação de acesso a tratamento adequado a uma população que poderia beneficiar-se dele e que não pode decidir participar ou não do estudo. Como também não é possível normatizar a dosagem ou a indicação de determinada medicação para um grupo de participantes, em geral a interferência de diferentes tipos de medicações em estudos a respeito da linguagem de algumas populações ainda tem baseado-se preponderantemente em analises individualizadas. Por outro lado, muito poucos estudos na área da fonologia, por exemplo, fazem referência à história orgânica e afetiva de seus sujeitos. Em geral as perspectivas teóricas enfocadas nesses estudos não consideram questões como a catexia da região oral, importantes para o desenvolvimento fonológico. O nível de desenvolvimento cognitivo dificilmente é abordado nos estudos a respeito da linguagem de pessoas surdas, quer por convicções filosóficas, quer por dificuldades práticas. Assim, temos uma realidade em que as pesquisas com a linguagem que adotam uma abordagem quantitativa têm enfrentar o fato de que a objetividade buscada defronta-se com dificuldades importantes para a determinação de grupos de pesquisa homogêneos e que permitam a replicação da pesquisa. Se há importantes problemas com os grupos de pesquisa, essas dificuldades não são menores com os grupos-controle. A idéia de determinação de grupos-controle baseia-se na necessidade de verificação de que o resultado obtido com o grupo de pesquisa é efetivamente característico daquela população e não algo casual ou normal. Entretanto, as grandes diferenças individuais mencionadas são observadas também na normalidade. Assim, a maioria dos estudos determina grupos que são pareados segundo algum elemento, diferente daquele que está sendo pesquisado. O resultado dessa tendência, é que não são raros, na literatura nacional e internacional, estudos que, por exemplo, para investigar especificamente a redação de jovens surdos, utilizam como critério de pareamento, o nível de alfabetização, e comparam surdos de 18 ou 20 anos, com crianças normais de 8 ou 9 anos. Ou estudos que pareiam crianças autistas com crianças normais segundo seu vocabulário, resultando em um grupo-pesquisa com 15, 16 anos e um grupo controle com 2, 3 anos. Ou estudos que, para investigar a linguagem de pessoas com síndrome de Down, utilizam o QI não verbal como critério e pareiam grupos-pesquisa de 16,17 anos com grupos controle de 3, 4 anos. Quaisquer que sejam os resultados desses estudos, eles estão muito longe da objetividade e da especificidade pretendidas. As abordagens em que os indivíduos são seus próprios controles têm sido defendidas por diversos autores. Um outro problema a ser enfrentado é o do tamanho das amostras. Os estudos em linguagem em geral envolvem amostras pequenas, que pela necessidade de tratamento minucioso dos dados, quer pela dificuldade em determinar grupos de pesquisa com alguma homogeneidade. Fica claro que a grande variação de alterações e distúrbios de linguagem não pode ser pesquisada a partir de um único modelo.
 
Contato: fernandadreux@aol.com
 

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