AUDIÇÃO E MUDANÇAS COGNITIVAS DA AUDIÇÃO NO ENVELHECIMENTO |
Ieda Chaves Pacheco Russo
Palestrante |
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O fluxo constante de comunicação e informação mantém o indivíduo ativo na sociedade. O isolamento da pessoa idosa, particularmente, da sociedade mais jovem e o conseqüente declínio na qualidade de sua comunicação, devido aos déficits sensoriais, geram um impacto psicossocial profundo neste idoso. Comunicar é partilhar com alguém um conteúdo de informações, pensamentos, idéias, desejos e aspirações, com quem passamos a ter algo em comum. A comunicação feita por meio da linguagem falada responde à necessidade vital do homem na busca de novas experiências e conhecimentos, sendo um ato social fundamental em nossas vidas. Entretanto, a aquisição e a manutenção da linguagem falada requerem entre outras coisas uma perfeita audição; ouvir a linguagem por determinado tempo é essencial para ultimar o seu uso. Além disso, a audição é imprescindível como mecanismo de alerta e defesa contra o perigo, permitindo localizarmos fontes sonoras à distância, dando-nos segurança e participação vital. Todavia, com o passar do tempo associado a fatores como a exposição do ouvido a ruídos intensos, uso indiscriminado de medicamentos, tensão diária e doenças, vamos perdendo nossa sensibilidade auditiva reduzindo, assim, nossa área de audição. Ouvimos, mas não entendemos, principalmente em ambientes ruidosos; sons fortes nos incomodam; zumbidos e dificuldade de perceber sons musicais mais agudos, podem ser alguns dos sintomas desta perda de audição conhecida como presbiacusia, ou perda auditiva decorrente do processo de envelhecimento (Russo,1999). A deficiência auditiva gera no idoso um dos mais incapacitantes distúrbios de comunicação, impedindo-o de desempenhar plenamente o seu papel na sociedade. É comum observarmos o declínio da audição acompanhado de uma diminuição frustrante na compreensão da fala no idoso, comprometendo sua comunicação com os familiares, amigos, enfim, todas as pessoas que o cercam. De todas as privações sensoriais, a perda auditiva é a que produz efeito mais devastador no processo de comunicação do idoso. Além disso, tem sérias implicações psicossociais em sua qualidade de vida e na qualidade de vida daqueles que convivem com ele no dia-a-dia. A perda auditiva produz mais efeitos deletérios no processo de comunicação do idoso. Assim, para entendê-la melhor, é fundamental compreender o processo de envelhecimento do sistema auditivo. O avançar da idade leva a presbiacusia (perda auditiva no idoso) ou ao decréscimo fisiológico da audição, ocasionada, em especial, pela interação de fatores como o ruído gerado pela civilização industrial, a alimentação, os medicamentos, a tensão diária e a predisposição genética. A presbiacusia implica alterações degenerativas no sistema auditivo como um todo. Ocorre perda auditiva mais acentuada para freqüências altas (sons agudos), o que afeta, de modo predominante, a compreensão da fala.O envelhecimento do ouvido humano é o resultado cumulativo de vários aspectos etiológicos extrínsecos, somados ao modelo de envelhecimento geneticamente determinado (Gilad e Glorig 1979; Novak e Glorig, 1990). Ser portador de deficiência auditiva adquirida é algo que vai além de não ouvir bem. As frustrações que o indivíduo vivencia por sua inabilidade em compreender o que seus familiares e amigos estão dizendo representam um desafio. É, portanto, mais cômodo afastar-se das situações nas quais a comunicação ocorre em vez de enfrentar embaraços decorrentes da falta de compreensão ou de respostas inapropriadas dadas às questões não entendidas de maneira correta. Por esse motivo, é muito freqüente que os familiares descrevam o idoso portador de deficiência auditiva como um indivíduo confuso, desorientado, distraído, não comunicativo, não colaborador, zangado, velho e senil (Ventry e Weinstein, 1982). O aumento da pressão auto-imposta para ser bem-sucedido na compreensão da mensagem gera ansiedade e, em conseqüência, aumento da probabilidade de falhar na tarefa. A ansiedade leva à frustração, que conduz à falha; a falha, por sua vez, leva à raiva, que, por fim, conduz ao afastamento da situação de comunicação. Os resultados desse processo são o isolamento e a segregação. Kricos e Lesner (1995) resumiram as implicações da deficiência auditiva no idoso e destacaram: redução na percepção da fala em várias situações e ambientes acústicos; alterações psicológicas tais como depressão, embaraço, frustração, raiva e medo, causados pela incapacidade pessoal de se comunicar com os outros; isolamento social, ou seja, interação com família, amigos e comunidade seriamente afetada; incapacidade auditiva em igrejas, teatros, cinemas, assim como diante de rádio e TV; problemas de comunicação com médicos e profissionais afins; problemas relacionados ao alerta e à defesa, como incapacidade de ouvir o ruído de pessoas e veículos se aproximando, o barulho de uma panela no fogo, o som de alarmes, a campainha do telefone, a campainha da porta e anúncios de emergência feitos na mídia. Uma forma de minimizarmos estes efeitos negativos da deficiência auditiva nestes indivíduos é a utilização dos recursos tecnológicos à disposição do fonoaudiólogo que atua na Audiologia Aparelhos de Amplificação Sonora (AAS), também chamados de próteses auditivas, e equipamentos auxiliares para a Audição. Atualmente, o processo de escolha de um sistema de amplificação depende de um programa de adaptação ao uso destes sistemas. A implantação de um programa de reabilitação audiológica global, que auxilie o idoso portador de deficiência auditiva, bem como seus familiares, a lidarem com as desvantagens e incapacidades resultantes desta deficiência, no qual a adaptação do aparelho de amplificação sonora seja encarada, não como essência, mas sim como parte integrante deste programa, poderá acelerar esse processo, contribuindo para restaurar o seu bem estar físico, mental e social. O fonoaudiólogo pode afirmar, sem medo, que mergulha no mundo da deficiência auditiva com total segurança e consciência, contando com recursos que abrangem desde a fonética até a fala robotizada; desde a exploração da orelha externa até o implante coclear; desde o ruído até a preservação da audição (Boéchat, Russo e Almeida, 2003). Com certeza, o profissional da fonoaudiologia tem a oferecer ao indivíduo que por ele procura para ouvir melhor uma gama de opções terapêuticas, as quais, aliadas aos instrumentos essenciais, criam condições que permitem restaurar a capacidade auditiva desse indivíduo, diminuindo sua deficiência. Re-inserir o idoso deficiente auditivo no mundo da comunicação verbal significa tirá-lo do isolamento imposto pela deficiência e permitir-lhe acessar a linguagem que o envolve. Nessa perspectiva, o fonoaudiólogo deixa de ser um técnico, preocupado com as questões físicas e eletroacústicas da deficiência auditiva e passa a ser um profissional que busca meios e estratégias que possam conservar as habilidades auditivas necessárias à manutenção da troca de informações entre as pessoas, que se concretiza na linguagem.Ao voltar o seu olhar para o idoso portador da deficiência auditiva, o fonoaudiólogo procurou encontrar respostas que explicassem o abandono do uso dos sistemas de amplificação. O caminho encontrado para alcançar tal propósito foi ouvir o indivíduo. A partir desse momento, o profissional deixou de ser o dono do conhecimento e o indivíduo deixou de ser passivo, mero receptor, transformando-se em elemento ativo no processo de escolha do seu sistema de amplificação.Assim, enfrentar esse “inimigo”, que tanto compromete a qualidade de vida dos cidadãos mais velhos, constitui um desafio para o fonoaudiólogo. Para isso, ele precisa se preparar cada vez mais para a velhice e minimizar os impactos emocionais, sociais, culturais e econômicos por ela gerados. Por meio de uma atuação fonoaudiológica efetiva nos programas de reabilitação audiológica, é possível combinar os avanços tecnológicos da ciência com o humanitarismo e a arte, sobretudo valorizando a pessoa idosa e tratando-a não como fardo ou encargo, mas como verdadeiro patrimônio.
Referências Bibliográficas:
Boéchat EM, Russo ICP, Almeida K. Reabilitação auditiva do adulto. In: Almeida K, Iorio MC M. Próteses Auditivas: fundamentos teóricos e aplicações clínicas. 2. ed. rev. amp. São Paulo: Lovise, 2003. cap. 18, p. 437-446.
Gilad C, Glorig A. Presbycusis: the aging ear. Part I. J. Am. Aud. Soc., v. 4, n. 5, p. 195-206, 1979.
Kricos PB, Lesner SA. Hearing care for older adult. Audiologig rehabilitation. Boston: Butterworth-Heinemann, 1995.
Novak RE, Glorig A Considerations for the selecting and fitting of amplification for geriatric adults. In: Sandlin RE. (ed.). Handbook of Hearing Aid Amplification. Boston: College-Hill, 1990. vol. II.
Russo IC P. Distúrbios da audição: presbiacusia. In: Russo ICP.(org.) Intervenção Fonoaudiológica na Terceira Idade. Rio de Janeiro: Revinter, 1999. cap. 4, p. 51-82.
Ventry I; Weinstein B. Identification of elderly people with hearing problems. ASHA, v. 25, p. 377-341, 1982.
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