ESTUDO DE CASO - LINGUAGEM NO ENVELHECIMENTO / DEMÊNCIA
Ana Paula Machado Goyano Mackay
Apresentador(a) de Caso
Instituição: FCMSCSP - CURSO DE FONOAUDIOLOGIA
 
A apresentação deste caso clínico tem como objetivo oferecer uma oportunidade para reflexões sobre o fato de que o tratamento fonoaudiológico de um paciente idoso e com demência vascular é viável e pode se constituir numa oportunidade do sujeito resgatar sua comunicação. A literatura atual indica que não há um declínio na habilidade de aprender ou desenvolver a linguagem , salvo algumas considerações como perda auditiva e visual. Contrariando estereótipos populares, o idoso é capaz de desenvolver novas habilidades tanto em língua materna como em uma segunda língua. O contexto vai ter uma maior influência nas condições de atenção e motivação paralelas à aprendizagem. Os estudos sobre neuroplasticidade, enquanto habilidade dos circuitos neurais de sofrer modificações na função ou organização à partir da atividade anterior, também sugerem que este processo cerebral perdura por toda a vida embora diminua na fase do envelhecimento. As alterações no funcionamento cognitivo, e aqui incluímos as da comunicação e da linguagem, que ocorrem no envelhecimento saudável, não são muito pronunciadas e não afetam a eficiência da pessoa para executar as tarefas do dia-a-dia. Tais alterações apresentam a heterogeneidade como maior característica. Assim, nem toda a deterioração cognitiva vem a ser demência. Observam-se perturbações da memória e outros distúrbios cognitivos, de grau leve a moderado, que não conduzem a uma demência. Como exemplo podemos citar a depressão, especialmente nas pessoas idosas, que pode apresentar sintomas semelhantes à demência. A importância da demência tomou grandes proporções em nosso meio, com o envelhecimento populacional do Brasil O termo demência abrange diversas doenças do cérebro e caracteriza-se por uma perda progressiva da memória associadas a outras, tais como: perda gradual da linguagem (afasia/disfasia), perda das aptidões motoras (dispraxias) e da percepção (agnosia). Os déficits são suficientemente evidentes para causar perturbação no funcionamento ocupacional, e/ou social, e sugerem um declínio de um funcionamento previamente mais elevado. A prevalência aumenta com a idade, ou seja, duplica a cada 5 anos: de 1 a 4% entre os 65 e 70 anos, até 22%, ou mais, aos 85-90 anos. A incidência anual de demência também cresce sensivelmente com o envelhecimento, de 0,6% na faixa dos 65-69 anos para 8,4% naqueles com mais de 85. É fundamental, portanto, que os profissionais de saúde estejam capacitados para diagnosticar e monitorar a evolução dos sintomas desses pacientes, segundo suas especialidades. De etiologia variada, nos idosos predominam as demências degenerativas e vasculares: a primeira causa mais freqüente é a doença de Alzheimer e a segunda é a demência vascular (DV), causada por doenças cerebrovasculares e associada a arterites, aterosclerose, hipertensão arterial sistêmica, diabetes e cardiopatias embolizantes. Nos quadros de DV, a tomografia computadorizada (TC) do crânio e a imagem por ressonância magnética (IRM) geralmente evidenciam múltiplas lesões vasculares do córtex cerebral e estruturas subcorticais. Dentro dos critérios de diagnóstico da demência vascular, segundo o DSM IV, os déficits cognitivos podem ocorrer com manifestações do tipo afásicas, apráxicas e agnósicas. Nos idosos, é possível que ocorram quadros combinados e por isso o reconhecimento da hidrocefalia de pressão normal (HPN), como causa potencialmente tratável de demência, tem recebido atenção crescente (Melato, Bigal e Speciali, 2000). Na hidrocefalia de pressão normal podem ser observadas, além da demência, incontinência urinária (que só aparece tardiamente na DA) e falta de coordenação da marcha e, há casos em que a redução da hidrocefalia acarreta diminuição de algum destes sinais. Apresentaremos, a seguir, dados do caso clínico de uma paciente encaminhada ao nosso consultório pelo neurologista, com queixa de dificuldades de memória e dificuldades de expressão. O diagnóstico clínico médico (2003) era indicativo de Demência Vascular (anteriormente descrita como demência Multi infarto, segundo o DSM IV), mas a orientação para a consulta fonoaudiológica ocorreu um ano após, mediante insistência dos familiares que estavam enfrentando as dificuldades comunicativas cada vez mais evidentes, com conseqüências sensíveis nas AVDs. Trata-se de uma senhora com 86 anos, viúva, sem filhos, segundo grau completo, funcionária pública aposentada e praticante de atividades esportivas desde a adolescência (atletismo, basquete e natação). Bastante dedicada à família, principalmente aos sobrinhos, que ainda mora sozinha sendo atendida por duas cuidadoras, que são auxiliares de enfermagem. Segundo o estudo de Almeida (1998), o MMSE é uma escala de avaliação cognitiva prática e útil na investigação de pacientes com risco de demência, como é o caso de idosos. Para idosos com alguma instrução escolar o ponto de corte deve ser 23/24, e está associado a sensibilidade de 78% e especificidade de 75%. Dentre outros aspectos deste tratamento, tecemos considerações sobre o fato do MMSE no início da terapia ter tido um score de 9\\\\30 e de 4 meses após, mesmo com um AVC isquêmico leve no período, o score ter subido para 15\\\\30. As modificações mais sensíveis ocorreram nos aspectos de orientação espacial e linguagem (incluindo memória) e as menos evidentes no aspecto da orientação temporal. Quanto à avaliação de linguagem oral e escrita, por exemplo, verificamos que no início do tratamento não foi possível realizar nenhuma prova visto a paciente não se engajar na atividade de avaliação. Com uma proposta centrada nos interesses maiores que permearam a sua história de vida, foi possível “despertar” um interesse na atividade comunicativa em si, nos ganhos da relação em que se compartilha sentidos e na necessidade de uma comunicação mais eficiente, para a melhor qualidade de vida diária. Destamos a importância do apôio das cuidadoras, orientadas a cada sessão fonoaudiológica. Após 3 meses de sessões, propusemos as tarefas de avaliação ( Teste de Nomeação de Boston, Teste da Avaliação das Afasias Rio de Janeiro, observação clínica da comunicação durante os procedimentos da avaliação) e, neste momento, foi possível observar: participação ativa em todas as atividades, processamento da respostas para provas de repetição - presente, compreensão dos objetivos das tarefas - presente, possibilidade de comunicação tanto pela modalidade oral como pela escrita, vocabulário adequado às tarefas de avaliação, e a presença da ironia e das piadas na interação (uma das características da comunicação da paciente, segundo informação de familiares próximos). Paralelamente, abordamos aspectos lingüísticos pragmáticos e discursivos que evoluiram neste período, ou seja, o aumento da participação ativa nas atividades comunicativas bem como a verificação de mudanças qualitativas e quantitativas no vocabulário e estrutura frasal. annapaulamacakay@yahoo.com
 
Contato: annapaulamackay@yahoo.com
 

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