Código: PIM1547
AVALIAÇÃO OBJETIVA DAS FORÇAS AXIAIS PRODUZIDAS PELA LÍNGUA DE CRIANÇAS RESPIRADORAS ORAIS |
|
Autores: Tatiana Vargas de Castro Perilo, Andréa Rodrigues Motta, Estevam Barbosa de Las Casas, Jorge Milton Elian Saffar, Cláudio Gomes da Costa |
Instituição: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS |
|
A língua humana é um órgão essencialmente muscular que participa ativamente de diversas funções do sistema estomatognático (Ardran, Kemp, 1956), sendo que o respirador oral necessita adequar a postura dessa estrutura para facilitar a passagem de ar pela cavidade oral (Tomé et al, 1996). Tal postura adquirida promove a diminuição da tensão lingual, resultando em uma língua flácida e larga, o que favorece alterações oclusais (Ferreira, 1999) e das funções estomatognáticas. Perante a complexidade dos movimentos e funções da língua, torna-se difícil desenvolver um instrumento único que possa fazer a medição das forças linguais. Porém, percebe-se cada dia mais a necessidade dessa instrumentação, visto que o fonoaudiólogo se depara freqüentemente com a necessidade de avaliar esta estrutura, principalmente nos pacientes com queixas de distúrbios miofuncionais orofaciais e cervicais, como as crianças respiradoras orais. De necessidades, como esta, criadas pelas Ciências da Saúde, surgiu a Biomecânica, ciência que combina o campo da Engenharia Mecânica com os campos da Biologia e Fisiologia, onde os princípios da mecânica são aplicados na concepção, modelo, desenvolvimento e análises de equipamentos e sistemas na Biologia e Medicina (Ozkaya, Nordin, 1999).
As primeiras pesquisas sobre medições de forças orais relataram a construção de um instrumento que continha uma cápsula de borracha preenchida com ar, interligada a um manômetro preenchido por álcool (Feldstein, 1950). Outro, baseado na transformação das pressões exercidas pela mordida, foi desenvolvido sobre uma cápsula oca de borracha, preenchida com ar, a ângulos proporcionais à magnitude da pressão (Margolis, Prakash, 1954). Alguns trabalhos de pesquisa foram baseados no desenvolvimento de métodos diretos de medição de forças orais. Em um destes, empregando dinamômetros de molas, foram medidas a força produzida pela língua de dentro para fora e a força de preensão labial. Foram avaliados 10 sujeitos com oclusão normal e oito que apresentavam algum tipo de má oclusão, ambos os grupos com idades entre oito e 18 anos (Posen, 1972). Em outro trabalho também utilizando método direto, por meio de um transdutor de força do tamanho de uma moeda, foi medida a força produzida pela língua em diversas situações, como na produção de alguns fonemas e de movimentos repetitivos (Dworkin, 1986). Em outro estudo, utilizando um transdutor que media a força lingual nas direções cranial e lateral, foram feitas as medições em 44 indivíduos portadores de Miastenia Gravis. Os valores máximos de força encontrados foram na direção cranial, na ordem de 12 N (Weijnen, 2000). Em outra pesquisa, foram utilizados sensores de pressão adaptados ao eixo do palato, com o objetivo de medir as forças exercidas pela língua durante o processo de deglutição (Saito, 2001). Vários pesquisadores, nas últimas décadas, desenvolveram métodos para a medição das forças produzidas pela língua humana, com o intuito de avaliar quantitativamente as suas funções, porém, poucos métodos desenvolvidos foram além do estágio introdutório (Motta et al, 2004).
Diante do exposto este estudo teve como objetivos quantificar e comparar as forças axiais produzidas pela língua de crianças respiradoras orais pré-cirúrgicas, respiradoras orais em tratamento fonoaudiológico e crianças respiradoras nasais; além de comparar os achados da avaliação objetiva com os dados da avaliação clínica subjetiva sobre as características linguais de cada criança participante.
Constituíram a amostra deste estudo transversal 15 crianças, de ambos os gêneros, com idades entre oito e doze anos, sendo cinco respiradoras orais pré-cirúrgicas (grupo 1), cinco respiradoras orais em tratamento fonoaudiológico (grupo 2) e cinco respiradoras nasais (grupo 3). Todas as crianças participantes foram inicialmente submetidas a uma avaliação otorrinolaringológica, no Ambulatório do Respirador Oral de um Hospital Universitário da cidade de Belo Horizonte/Minas Gerais. Em seguida, passaram por uma avaliação fonoaudiológica clínica, onde verificou-se subjetivamente as características da língua destas crianças, tais como tensão, postura, mobilidade e aspectos morfológicos. Para aumentar a confiabilidade dos dados, as avaliações clínicas foram realizadas somente por um pesquisador, assegurando um parâmetro padrão de tensão lingual.
Na segunda parte desta pesquisa, foi realizada a avaliação objetiva da força lingual das crianças participantes. O método utilizado (Motta et al, 2003) foi baseado na transformação da força em pressão, por meio de um conjunto pistão-cilindro (CPC) acoplado à boca do paciente, de modo a permitir a compressão do pistão, ou êmbolo, pela ação da língua. O conjunto pistão-cilindro empregado foi uma seringa hipodérmica de vidro, marca Yale, de capacidade nominal 5 ml. O êmbolo foi posicionado de modo reprodutível na boca das crianças participantes, uma vez que o CPC foi encaixado no rasgo frontal, de respiração, de um protetor oral duplo, de borracha de silicone, do mesmo tipo utilizado pelos boxeadores. Uma vez posicionado, o CPC foi preenchido com água até que se completasse o volume de 1 ml. O mordedor foi então encaixado e ajustado na boca do participante. Após um período de acomodação de cerca de 15 segundos, a criança foi orientada a impulsionar o êmbolo com a maior força que fosse capaz de realizar e manter a aplicação dessa força por 7 segundos. O procedimento foi realizado por mais três vezes, com intervalo de 2 minutos entre as séries de medições em cada uma das crianças. Por fim, os dados colhidos na avaliação clínica subjetiva e na avaliação objetiva da força lingual foram comparados e analisados. Foram pesquisadas as forças médias, que equivaleram à média da somatória das forças que o participante conseguiu imprimir nas quatro medições, e as forças máximas, que corresponderam à média da soma dos maiores valores de força alcançados pelos participantes nas quatro medições. Ambos valores foram expressos em Newtons (N). Foram obtidas, de cada criança participante, quatro medições objetivas da força axial da língua, totalizando 60 medidas; e 15 avaliações clínicas, uma para cada participante.
No grupo 1 a média dos valores de força máxima foi de 8,2N e de força média de 5,6N. No grupo 2 foram encontrados valores médios de força máxima de 9,2N e de força média de 6,0N. Já no grupo 3 estes valores variaram de 10,4N para a força máxima e 7,3N para a força média. Dos 15 participantes desta pesquisa, 12 apresentaram tensão adequada de língua na avaliação clínica, sendo três do grupo 1, quatro do grupo 2 e cinco pertencentes ao grupo 3. Estas crianças obtiveram valores de força média que variaram de 1,4N a 10,2N, com média de 7,01N. Um participante apresentou leve hipotensão de língua na avaliação clínica e obteve 6,4N de força média e 8,1N de força máxima e outras duas crianças apresentaram hipotensão lingual na avaliação subjetiva, sendo uma do grupo 1 e uma do grupo 2, com valores de força média de 1,4N e 2,6N (média de 2N) e valores de força máxima de 3,4N e 3,7N (média de 3,6N).
As medições objetivas da força axial da língua realizadas neste estudo provieram de um método direto de medição de força, o que tem sido adotado nos estudos mais recentes, por eliminarem um maior número de erros e variáveis numéricas nas análises em questão. Neste estudo, a maioria (70%) das crianças respiradoras orais participantes não apresentou diminuição da tensão da língua na avaliação clínica, fato contrário à literatura, uma vez que esta característica é citada como predominante neste grupo (Marchesan, 1993). Reafirma-se assim, a importância de uma avaliação fonoaudiológica cuidadosa e não a estigmatização do paciente. Na análise intergrupos os valores de força encontrados na avaliação objetiva foram condizentes com as características da população de cada grupo, tendo os respiradores nasais apresentados os maiores índices de força e o grupo de respiradores orais pré-cirúrgicos os menores valores. Um único trabalho encontrado na literatura (Posen, 1972) avaliou a força máxima da língua humana no sentido axial, e o fez em uma população infantil. Foram descritos valores médios da força máxima da língua de 1534,83 gramas-força (equivalente a aproximadamente 15N). Já no presente estudo, o grupo 3, composto por crianças respiradoras nasais, apresentou esta medida em 10,4 N, valor ligeiramente menor.
Houve concordância nos valores obtidos na avaliação objetiva e os achados da avaliação clínica, tendo as crianças que apresentaram tensão adequada de língua, obtido os maiores valores nas medições, e as classificadas como possuindo língua hipotensa os valores mais baixos. No entanto, duas crianças chamaram a atenção por apresentarem valores muito baixos nas medições quando comparados aos valores obtidos pelo grupo 3, e tensão adequada na avaliação clínica. Entretanto, deve-se ressaltar que uma delas possuía uma má oclusão importante, o que dificultou imensamente o encaixe correto do aparelho, e a outra apresentou, na avaliação clínica, um frênulo curto, o que anatomicamente dificulta a propulsão axial da língua. A avaliação fonoaudiológica em motricidade orofacial tem buscado a precisão em seu diagnóstico. A confirmação dos parâmetros encontrados na avaliação clínica e durante o processo terapêutico, com valores quantitativos, propicia a facilitação da conduta e a relação interprofissional.
Nesta pesquisa a média das forças médias e máximas foram maiores nos indivíduos respiradores nasais, seguidos pelos respiradores orais em tratamento fonoaudiológico e por fim, apresentando os menores valores, os respiradores orais pré-cirúrgicos. Houve concordância entre os resultados das avaliações objetiva e clínica da força lingual, tendo o método utilizado nesta pesquisa mostrado-se eficaz na aplicação clínica, reafirmando os achados subjetivos. |
|
1. Ardran G, Kemp F. Closure and opening of the larynx during swallowing. Br J Radiol 1956;29:205-8.
2. Barnwell YM. Human lingual musculature: An historical review. Int J Orofacial Myology 1976;2(2):31-41.
3. Carvalho GD. S.O.S. Respirador Oral: uma visão funcional e clínica da amamentação. São Paulo: Lovise; 2003.
4. Cintra CFSC et al. As alterações orofaciais apresentadas em pacientes respiradores bucais. Rev Bras Alerg Imunopatol 2000;23:78-83.
5. Dalrymple Kr, Prigozy TI, Shuler CF. Embryonic, fetal and neonatal tongue myoblasts exhibit molecular heterogeneity in vitro. Differentiation 2000;66:218-26.
6. Di Francesco RC. Respirador bucal: a visão do otorrinolaringologista. Jornal Brasileiro de Fonoaudiologia 1999;1:56-60.
7. Douglas CR. Tratado de Fisiologia aplicada à Fonoaudiologia. São Paulo: Robe; 2002.
8. Dworkin JP, Aronson AE. Tongue strength and alternate motion rates in normal and dysarthric subjects. J Commun Disord 1986;19:115-32.
9. Feldstein L. An instrument for measuring muscular forces acting on the teeth. Chicago 1950:856-59.
10. Ferreira ML. A incidência de respiradores bucais em indivíduos com oclusão classe II. Jornal Brasileiro de Fonoaudiologia 1999;1:83-96.
11. Frankel R, Frankel C. Ortopedia orofacial com regulador de função. São Paulo: Santos; 1990.
12. Gray FRS. Sistema Digestivo. In: Gray FRS. Anatomia. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 1988. p. 965-69.
13. Hiyama S, Iwamoto S, Ono T, Ishiwata Y, Kuroda T. Genioglossus muscle activity during rhythmic open-close jaw movements. J Oral Rehabil 2000;27:664-70.
14. Gould MSE, Picton DCA. A method of measuring forces acting on the teeth from the lips, cheeks and tongue. Br Dental J 1962;112:235-39.
15. Krakauer LH, Di Francesco RC, Marchesan IQ (org). Conhecimentos essenciais para entender bem a respiração oral. São José dos Campos: Pulso; 2003.
16. Luschei ES. Development of objective standards of non-speech oral strength and performance. In: Moore CA, Yorkston KM, Beukelman DR, editors. Dysarthria and Apraxia of Speech: Perspectives on Management. Baltimore: Paul H. Brookes; 1991. p.3-14.
17. Marchesan IQ. Motricidade oral: visão clínica do tratamento fonoaudiológico integrado com outras especialidades. São Paulo: Pancast; 1993.
18. Marchesan IQ. Fundamentos em fonoaudiologia: aspectos clíncios da motricidade oral. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 1998.
19. Marchesan IQ, Junqueira P. Atipia ou adaptação: como considerarmos os problemas da deglutição. São Paulo: Pancast; 1997.
20. Margolis H, Prakash P. A new instrument for recording oral muscle forces: the photoelectric myograph. J Dent Res 1954: 425-34.
21. Matsumura M, Niikawa T, Tanabe T, Tachimura T, Wada T. Cantilever-type force-sensor-mounted palatal plate for measuring palatolingual contact stress and pattern during speech phonation. 5th International Conference on Spoken Language Processing. 1998 Nov 30th –Dec 4th. Sidney.
22. Miller JL, Watkin KL. The influence of bolus volume and viscosity on anterior lingual forces during the oral stage of swallowing. Dysphagia 1996;11:117-24.
23. Miller J, Watkin KL, Chen MF. Muscle, adipose, and connective tissue variations in intrinsic musculature of the adult human tongue. J Speech Lang Hear Res 2002;45:51-65.
24. Miyawaki K. A study of the musculature of the human tongue. Ann Bull Res Inst Logoped Phoniat 1974;8:23-50.
25. Moraes MEF, Felício CM. Avaliação do sistema estomatognático: síntese de algumas propostas – Parte II. J Bras Fonoaudiol 2004;5(18):53-9.
26. Motta et al. Método objetivo para a medição de forças axiais da língua. CEFAC 2004;6(2):164-9.
27. Parizotto SPCOL, Nardão GT, Rodrigues CRMD. Atuação multidisciplinar frente ao paciente portador da síndrome da respiração bucal. J Bras Clin Ondotol Int 2002;6:445-9.
28. Posen AL. The influence of maximum perioral and tongue force on the incisor teeth. Forces 1972;42:285-309.
29. Pouderoux P, Kahrilas P. Deglutition tongue force modulation by volition, volume, and viscosity in humans. Gastroenterology 1995;108:1418-26.
30. Saito Y, Motoyoshi M, Arimoto M, Itoi K, Shimazaki T, Naimura S. Tongue pressure on the palate during deglutition. Dent Jap 2001;37:85-7.
31. Smith KK, Kier WM. Trunks, tongues, and tentacles: moving with skeletons of muscle. Am Scientist 1989;77:29-35.
32. Takemoto H. Morphological analyses of the human tongue musculature for three-dimensional modeling. J Speech Lang Hear Res 2001;44:95-107.
33. Tomé MC, Farret MMB, Jurach EM. Hábitos orais e maloclusão. In: Marchesan IQ, Zorzi JL, Gomes ICD, organizadores. Tópicos em Fonoaudiologia III. São Paulo: Lovise; 1996. p.177-94.
34. Urias D. Mordida aberta anterior. In: Petrelli E. Ortodontia para Fonoaudiologia. São Paulo: Lovise; 1994. p.177-93.
35. Zemlin WR. Princípios de Anatomia e Fisiologia em Fonoaudiologia. 4ª ed. Porto Alegre: Artmed; 2002.
36. Weijnen F, Kuks JBM, Van der Bitt A, Van der Glas HW, Wassenberg MWM, Bosman F. Tongue force in patients with myasthenia gravis. Acta Neurol Scand 2000;102:303-8. |
|
Contato: tativcp@yahoo.com.br |
|

Imprimir Trabalho |

Imprimir Certificado Colorido |

Imprimir Certificado em Preto e Branco |
|