ESTUDO DE CASO – LINGUAGEM NO ENVELHECIMENTO/DEMÊNCIA
Maria Lucia Gurgel
Comentador(a) de Caso
Instituição: UFPE / UNICAP
 
As estatísticas demográficas mais recentes demonstram a tendência do acelerado crescimento da população idosa, pessoas com 60 anos ou mais segundo critérios da ONU – Organização das Nações Unidas, este processo ocorre em nível mundial , inclusive nos países em desenvolvimento como o Brasil, cujo contingente de idosos pode atingir o índice de 30 milhões de pessoas em 2025, fato este que pode ser atribuído à redução de fecundidade, mortalidade infantil e doenças infecciosas.O quadro de mortalidade brasileiro sofreu uma importante modificação ao longo das últimas décadas, as doenças infecciosas, antes principais causas de óbitos entre os idosos, passaram a ter um maior controle e redução de ocorrência, devido, principalmente, ao advento de novas vacinas, pesquisas e medidas profiláticas, em contrapartida, o estilo de vida moderno contribuiu para alçar as doenças do aparelho circulatório, respiratório e neoplasias ao posto de principais agentes de mortalidade da população em geral, incluindo os senescentes; 60% dos óbitos são relacionados às enfermidades do trato circulatório, dentre as quais predominam os transtornos cerebrovasculares. (LIMA – COSTA, 2003). Esta apresentação tem como objetivo discutir aspectos relativos ao envelhecimento e o papel do Fonoaudiologo enquanto agente transformador deste processo, investindo em ações que visam a qualidade deste envelhecer. Pretendo através desta apresentação discutir as implicações sociais e míticas do envelhecer e refletir como estas podem interferir na auto-imagem do sujeito e por conseguinte em seu desempenho em situações discursivas. O caso em questão aponta para vertentes que sigo a abordar a primeira refere-se às implicações correlatas ao envelhecer em seus aspectos sociais ,econômicos,físicos e emocionais.Um segundo fato que merece destaque refere-se aos quadros demenciais e às dificuldades que envolvem o diagnóstico diferencial e tratamentos específicos. Finalmente é primordial refletir sobre o papel das relações sociais enquanto potencializadoras ou inibidoras da comunicação. Destaca-se em toda a discussão a importância de um olhar singularizado ao sujeito, onde a práxis do fonoaudiólogo deverá estar ajustada ao contexto e realidade deste.O envelhecimento está diretamente relacionado às experiências particulares de vida de cada sujeito, constituem e são constituídos pelo meio psicossocial, econômico, biológico, físico, cultural, experimentados por aquele que envelhece. Castro (1993) defende que a compreensão do idoso está permeada por valores e representações que são atribuídos ao envelhecimento como processo biologico, cultural e político. Nasi (in SUZUKI, 2003 ) entende que as característica específicas desta população a fazem merecedora de atenção especial, uma vez que no processo natural de envelhecimento ocorre uma redução da reserva funcional de vários órgãos e sistemas o que implica em maior ocorrência de algumas afecção patológicas.O envelhecimento é considerado uma etapa natural do desenvolvimento, caracterizada pela degenerescência psicofísica do ser humano.É um fato universal por ser comum a todos os seres vivos em idades avançadas. O envelhecimento é inexorável, gradativo e lento,sendo que, não existem marcos distintos que diferenciem suas etapas e seqüências ,é multidimensional,ocorrendo para diversos indivíduos com realidades biopsicossociais particulares . Segundo Agate (1970) o envelhecimento “é o conjunto das modificações morfológicas, fisiológicas e psicológicas que acompanham a idade cronológica”. A Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG,2004) destaca 5 “Is” da Geriatria: Insuficiência Cerebral; Instabilidade Motora; Imobilidade; Incontinência; Iatrogenia, destacando estes como o maiores desafios a serem enfrentados por aqueles que vivem ou convivem com processos de senescência. Parodiando a SBGG tomo a liberdade de trabalhar neste texto com os “Is” dificultadores sociais, para aqueles que vivem o envelhecimento em um país que apesar de vir sofrendo constantes mudanças em sua pirâmide populacional ainda não se deu conta que a cada dia torna-se uma nação em franco processo de envelhecimento populacional. Desta forma destaco 6 dificultadores principais: Isolamento; Intolerância; Indiferença: Incapacitação e atribuição de rótulos; Inadaptação; Ignorância. Isolamento: a própria privação sensorial, associada à perda do poder aquisitivo e papel econômico no núcleo familiar , interfere no lugar social ocupado pelos sujeitos. Soma-se a este fato uma sociedade que a cada dia desumaniza mais suas relações, substituindo pessoas por máquinas e exigindo uma reciclagem diária na resolução de problemas simples como sacar o próprio salário ou pagar uma conta em banco. Paralelamente vemos, dia a dia, as relações familiares caminharem para a coabitação em detrimento ao convívio social, situações típicas de encontro como refeições e conversas informais tendem a ser substituídas por bate-papos ao computador e refeições extra casa e encontros rápidos em self services, praças de alimentção ou fast food. Intolerância: cresce a cada dia o nível de competitividade o que dificulta a aceitação das necessidades do outro, desta forma aguardar por uma resposta que demora ou dar ao outro o tempo que necessita, está diretamente ligado à construção de uma sociedade inclusiva, que aceite o outro em suas particularidades o que parece, ainda, uma utopia. O Brasil é exemplo mundial no que se refere ao seu código quanto aos direitos do idoso, porém mais que escrever leis é preciso vê-las cumpridas; amargamos altos índices de violência ao idoso sub-notificada ou quando notificada, não apurada; Indiferença: governo e sociedade, por vezes, fecham os olhos para as necessidades básicas desta população, referentes à saúde ,moradia, lazer entre outros , todo este processo vem contribuir para a desqualificação e por vezes marginalização desta faixa da vida; Incapacitação e atribuição de rótulos: a idéia de idoso muitas vezes vem erroneamente acompanhada por “pré-conceitos” de incapacidade, que fazem com que por vezes excluam esta população da possibilidade de decidir quanto ao seu próprio destino. O mercado de trabalho tende a descartar o que seria considerada uma faixa improdutiva, desta forma dá prioridade à juventude em detrimento da experiência, a mudança do lugar econômico atinge diretamente o lugar social ocupado pelo sujeito e por conseguinte sua auto-imagem enquanto ser capaz de produzir, o que conseqüentemente refletirá nas suas produções e em sua possibilidade de construir e assumir projetos e metas; Inadaptação: o envelhecimento traz limites e necessidades de adaptação que envolvem facilitações relativas a audição , locomoção ,visão, memória, habilidades manuais, atividades fáceis podem ,sem as adaptações necessárias, transformarem-se em grandes desafios, fato que se agrava pela falta de recursos para adaptação dos serviços, qualificação de pessoal e espaços físicos para melhor atender esta população; Ignorância: o desconhecimento dos setores de saúde,educação, seguridade social, quanto às peculiaridades desta faixa etária agravam ainda mais o problema.Raciocínios que comparam o idoso ao infante e desconsideram sua experiência vêm demonstrar o pouco conhecimento sobre as peculiaridades de cada etapa da vida, o fato agrava-se se levarmos em conta que tais mitos são muitas vezes difundidos pelos próprios profissionais A atuação fonoaudiológica junto a idosos parece a primeira vista fazer pouco sentido, nesta profissão em que vimos de uma tradição de formação onde tende-se a privilegiar os estudos da infância e desenvolvimento, centrando-se no entendimento das patologias relativas ao envelhecimento enxergando este pela sua doença e muitas vezes desconsiderando a sua existência e experiências , não sendo,por vezes, levado em conta as mudanças inerentes a este processo. Aproximando-se do tema verifica-se a necessidade do investimento na formação do fonoaudiólogo afim de que conheça as especificidades deste período e processos visando a atuação, seja na prevenção de problemas associados ao envelhecimento, à promoção de saúde no envelhecer e a reabilitação nos casos de patologias instaladas. Thomaz (2002) fala discute a diferença entre senescência e senilidade. Onde a primeira seria relativa às alterações orgânicas, funcionais e morfológicas que ocorrem em conseqüência do processo de envelhecer e senilidade seria a modificação determinada pelas afecções que freqüentemente acometem os indivíduos idosos. Com o processo de envelhecimento diminuem progressivamente a capacidade de elaborar e integrar estímulos provenientes do organismo e do ambiente e de propor reação adequada. No sistema nervoso é observada uma diminuição da liberação de neurotransmissores. Os cincos sentidos também se tornam menos eficientes no decorrer do processo de envelhecimento, e isto causa insegurança nas atividades diárias e no bem estar geral do indivíduo. A mudança nos sentidos, vai interferir na captação das experiências sensoriais e na latência entre a recepção do estímulo e o tempo para a resposta a este ,o que faz do idoso merecedor me maior tempo para construção discursiva, associação de informações e compreensão das informações recebidas.Alterações como a presbiopia e presbiacusia irão interferir diretamente na recepção das informações pelo sujeito, sendo este ponto crucial a ser levado em conta durante o trabalho com esta faixa etária. Associa-se a isso a redução na velocidade das conexões neurais pela perda de neurotransmissores ,ou pelas modificações bioquímicas que interferem no funcionamento do sistema nervoso central e periférico. Tudo isso chama atenção para importância de uma clínica particularizada para esta população com instrumentos que sejam adaptados às necessidades deste grupo. Durante o debate em questão defendo a importância de um trabalho que envolva a família e comunidade em ações conjuntas e particularizadas àquele que procura o serviço fonoaudiológico.
 
Contato: malugurgel@terra.com.br
 

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