Código: PTV0736
JULGAMENTO DO COMPORTAMENTO VOCAL DE JORNALISTAS EM DIFERENTES ESTILOS DE NOTÍCIAS E SEUS CORRELATOS ACÚSTICOS |
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Autores: Adriana Campos Balieiro Panico, Sérgio Sheiji Fukusima (orientador) |
Instituição: FACULDADE DE FILOSOFIA CIÊNCIAS E LETRAS DE RIBEIRÃO PRETO - USP |
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Introdução: A linguagem falada é uma das manifestações da comunicação humana, permeada, como todo e qualquer ato comunicativo, pelo pressuposto da interatividade emissor-receptor. Em situações de comunicação profissional, onde a fala é construída para atingir objetivos específicos, é fundamental que se compreenda essa interação, uma vez que a mensagem só é real quando decodificada, reconhecida e interpretada pelo receptor. O telejornalismo é uma dessas situações onde o conteúdo, ou seja, a notícia, tem o objetivo de informar o telespectador. O comportamento vocal do jornalista (falante) é um dos componentes que pode ser modificado provocando interferência na percepção da emissão. Além disso, é uma habilidade comunicativa passível de treinamento. Entendê-lo então, é condição para promover a competência comunicativa e facilitar a atuação fonoaudiológica com esses profissionais que dependem de suas habilidades comunicativas para ter sucesso profissional.
Objetivo: Investigar a identificação e julgamento de diferentes estilos de emissões em telejornalismo classificados em três categorias: neutro, sério e descontraído; correlacionar os julgamentos dos diferentes estilos às medidas acústicas feitas por programa de análise acústica; verificar as dimensões em que se encontram as emissões, para cada estilo, e se elas poderiam ser identificadas por parâmetros acústicos; interpretar as correlações para intervenção com telejornalistas.
Método: Participaram da pesquisa 170 sujeitos entre 18 e 50 anos, de ambos os sexos, com pelo menos o segundo grau completo, sem histórico de problemas auditivos. Utilizaram-se fitas beta e VHS; CDs em formato áudio e wave; microcomputador; programa de análise acústica Dr. Speech 4.0 e folhas-resposta. O procedimento foi realizado em seis etapas: normatização dos termos, gravação da amostra, edição do material e análise acústica; identificação e julgamento dos estilos e análise dos dados. Na primeira etapa, para a norma-tização dos termos neutro, descontraído e sério, duas apresentações de um telejornal de abrangência nacional foram assistidas por cinqüenta sujeitos que classificaram as reportagens segundo as três categorias. Para orientar a classificação, os participantes receberam para cada termo definições pesquisadas em dicionário. Após a classificação, foi feito um escalonamento de cada tipo classificado de modo que se tivesse entre cada um deles, a reportagem mais neutra, a mais descontraída e a mais séria, para que servissem de modelo aos apresentadores que gravaram a amostra. O escalonamento também foi usado para definir o estímulo a ser gravado, que foi o segundo mais votado dentro das reportagens neutras. Na segunda etapa, dez apresentadores experientes, cinco do sexo masculino e cinco do sexo masculino, com atuação constante em telejornais de rede, gravaram esse texto, de mesmo conteúdo semântico, por três vezes, nos três estilos de emissão. Para essa gravação utilizou-se como modelo as reportagens mais votadas na primeira etapa para cada um dos estilos. As reportagens-modelo foram transcritas para servirem de exemplo para os apresentadores, que tiveram acesso somente ao texto, portanto não foram nem vistas nem ouvidas pelos apresentadores. A gravação foi feita em estúdio de televisão em fita beta, em vídeo e áudio, reproduzindo o ambiente de apresentação de telejornal, estando a seqüência a ser lida escrita no teleprompter. Na terceira e quarta etapa, a partir dessa gravação, foi separado o áudio em CD, em formato wave, para que se procedesse à análise acústica da amostragem, avaliando os parâmetros acústicos de freqüência, intensidade e duração da emissão; por meio do software Dr. Speech 4.0. Em outro CD, em formato áudio, as amostras foram randomizadas e julgadas por trinta sujeitos, que tiveram a tarefa de identificar os estilos. Posteriormente as amostras foram separadas, por estilo, em outros três CDs, em formato áudio, e apresentadas por meio do Método de Comparação aos Pares a leigos, para que fossem julgadas em função de cada um dos estilos de emissão. Na quinta etapa os resultados das identificações foram tabulados por freqüência de acertos e os parâmetros acústicos foram submetidos a uma análise de variância (ANOVA). Os julgamentos foram correlacionados a análise acústica por meio da correlação de Pearson e entre si, gerando matrizes de similaridades, cujos dados foram submetidos à análise multidimensional (MDS-Multidimensional Scaling) para que fossem determinadas as dimensões em que se encontravam os diferentes estilos de emissão. As coordenadas para cada dimensão determinada também foram correlacionadas a analise acústica por meio da Correlação de Pearson. Na sexta e última etapa, os resultados foram observados à luz da literatura estudada para possíveis apontamentos de técnicas de atuação.
Resultados: Os parâmetros acústicos que diferiram significativamente entre os estilos foram a Fo média, a Fo máxima, a variação de Fo e o tempo de fala. Os telespectadores foram capazes de identificar os diferentes estilos. Duas dimensões foram determinadas para cada estilo. No estilo descontraído, a primeira dimensão não teve parâmetro acústico significativamente correlacionado. Na segunda, sem distinção de gênero, foi significativo o número de semitons; para as vozes femininas a Fo mínima, a variação de Fo e o número de semitons; e para as vozes masculinas, nenhum parâmetro correlacionado foi significativo. No estilo neutro, a primeira dimensão, sem distinção de gênero, dois parâmetros foram significativamente correlacionados: Fo mínima e o número de semitons; para as vozes femininas, foi correlacionada significativamente a variação de Fo; e para as vozes masculinas, a Io máxima. Na dimensão dois, nenhum parâmetro foi correlacionado significativamente. No estilo sério, a primeira dimensão foi correlacionada significativamente com o parâmetro acústico tempo de fala, somente para as vozes masculinas. A dimensão dois apresentou os seguintes parâmetros correlacionados significativamente: sem considerar a distinção de gênero, a Fo média, Fo mínima e Io mínima; para as vozes femininas, a Io mínima; e para as vozes masculinas nenhum parâmetro acústico foi correlacionado significativamente. De acordo com a literatura, os parâmetros acústicos podem ser traduzidos pelos aspectos paralingüísticos da fala, ou seja, entonação, pausas e ênfases, que são passíveis de treinamento. Indivíduos treinados apresentam melhor performance do que os não treinados, o que demonstra a importância da intervenção fonoaudiológica. Técnicas de treino de percepção auditiva, segundo a literatura, permitem uma melhor performance no reconhecimento da função das pausas, assim como na conscientização do melhor uso da articulação e entonação.
Conclusões: Os ouvintes foram capazes de identificar os diferentes estilos de emissão por meio de pista auditiva. Há parâmetros acústicos que são positivamente modificados na produção de um estilo específico, que podem identificá-lo. Duas dimensões foram traçadas para cada estilo, mas somente no estilo sério, as duas tiveram correlações positivas com parâmetros acústicos. Nos estilos descontraído e neutro duas dimensões não se correlacionaram a nenhum parâmetro acústico. O trabalho fonoaudiológico é importante na medida em que aumenta a plasticidade vocal do falante, aumentando o interesse e a atenção, facilitando a compreensão do ouvinte. O desenvolvimento da competência comunicativa por meio da compreensão da interdependência dos aspectos verbais e não-verbais da comunicação, gerando consonância comunicativa, promove a efetividade da comunicação. |
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